CARTA DO 1º ENCONTRO NACIONAL DO MOVIMENTO BISSEXUAL BRASILEIRO (Carta de Brasília)


Neste ano de celebração do marco de 20 anos de movimento bissexual no Brasil, nós, pessoas bissexuais reunidas em Brasília dias 22 e 23 de setembro de 2023 no Espaço Cultural Renato Russo durante o I Encontro Nacional do Movimento Bissexual Brasileiro, chamado pela Frente Bissexual Brasileira, rede de coalizão nacional composta por coletivos e pessoas militantes autônomas atuantes no país e voltada para a articulação do movimento bissexual nacional, reconhecemos e afirmamos a importância deste espaço político de afeto e luta com centralidade bissexual. Assim como as diretrizes que localizam a Frente Bissexual Brasileira, o I Encontro Nacional do Movimento Bissexual Brasileiro se posiciona como um espaço articulado no campo progressista de esquerda, antirracista, trans aliado, anticapacitista, antifascista, antipatriarcal, feminista interseccional, em defesa da livre orientação sexual e de identidade de gênero e em defesa da laicidade do Estado, sem caráter comercial ou lucrativo. 

Perpassou todo o encontro a análise da conjuntura nacional e o entendimento de que embora estejamos hoje sob um governo de centro-esquerda progressista, é necessário nos manter articuladas e vigilantes para enfrentar retrocessos, notadamente por meio da atuação de um congresso nacional, assembleias legislativas e câmaras municipais  ainda hostis e violentas para pessoas LGBTI+, sejam elas parlamentares ou não, como nos casos de ameaças de estupro corretivo e de morte sofridas por parlamentares bissexuais e lésbicas. É urgente que a  inteligência do país esteja empenhada em destruir grupos de ódio que ameaçam a vida dessas pessoas e suas famílias.

A programação do encontro debateu políticas públicas para pessoas bissexuais no Brasil e suas especificidades; saúde bissexual e enfrentamento a bifobia, ressaltando os recortes da saúde mental e das pessoas vivendo com HIV, defesa do SUS, a saúde como direito e urgência da descriminalização e legalização do aborto; intersecções da luta bissexual, ressaltando as  encruzilhadas de pessoas bissexuais intersexo, transgêneras, negras, indígenas e com deficiência; mesa de debate e de exposição fotográfica ressaltando a memória de ontem, hoje e as perspectivas futuras do movimento bissexual brasileiro.

Durante a roda de acolhimento e validação com a participação de 35 pessoas bissexuais, evidenciou-se como a bifobia e suas práticas violentas de invisibilidade, rejeição e apagamento epistemológico ainda são temas recorrentes e comuns na vida de pessoas bissexuais. As agressões sofridas na sociedade como um todo, também de forma cruel dentro da própria comunidade LGBTI+, perpetradas principalmente por gays e lésbicas, são causadoras de grandes sofrimentos psíquicos e emocionais. Não é mais aceitável ou tolerável que pessoas bissexuais sejam invalidadas, desconsideradas ou apagadas nas construções do movimento LGBTI+, das políticas públicas e das relações sociais como um todo. Estamos em 2023 e grande parte das pessoas monossexuais (lésbicas, gays e héteros) articuladas no movimento LGBTI+ reproduzem bifobia diariamente em seus espaços de fala e construção. Não é mais aceitável ou tolerável que pessoas de luta no recorte LGBTI+ acreditem e reproduzam ideias descabidas de que o gênero da pessoa com quem nos relacionamos pode magicamente ditar ou redefinir a nossa identidade dissidente para algum dos extremos binários da monosexualidade. Já passou da hora de todas as pessoas articuladas no movimento LGBTI+ compreenderem a verdade sobre nossas vidas e sobre nossa identidade que rompe com a concepção tradicional, fixa e binária de sexualidade. 

A bissexualidade tensiona e rompe as fronteiras de gênero, sexualidade e vai mais além possibilitando a construção de uma nova realidade e sociedade mais justas e igualitárias em gênero, raça/etnia, classe, sexualidade e  livre de todas as opressões.  É preciso conhecer a história de pessoas revolucionárias que ousaram se declarar bissexuais e respeitar suas memórias, e aqui citamos simbolicamente Marielle Franco – que foi uma mulher negra bissexual periférica, vereadora do Rio de Janeiro/RJ, e dentre todas as suas identidades fundamentais ser uma pessoa bissexual não é menos revolucionária  – e Renildo dos Santos – que foi um homem bissexual comprometido com as lutas sociais, vereador de Coqueiro Seco/AL, que  foi cruelmente assassinado e sofre um apagamento de sua memória.

Pessoas bissexuais constroem o movimento LGBTI+ desde sempre,  destacamos a importância de Regina Facchini e outras tantas pessoas que não tivemos o direito de conhecer o nome. Valorizamos essas militâncias mesmo que sofram tentativas reiteradas de apagamento das suas colaborações dentro do movimento LGBTI+. 

O movimento bissexual tem compromisso com o enfrentamento do pacto da endocisheteronormatividade (norma social que oprime pessoas intersexo, trans, bissexuais, demais orientações não monossexuais, lésbicas e gays), da branquitude, do patriarcado. Lutamos pela possibilidade de ser, por uma vida digna, plena e livre de bifobia.    

Considerando os avanços teóricos e políticos da pauta da bissexualidade que nos trouxeram até aqui, os seguintes encaminhamentos foram deliberados no 1º ENCONTRO NACIONAL DO MOVIMENTO BISSEXUAL BRASILEIRO:












Desde já convocamos todas as pessoas a estarem conosco no 2º ENCONTRO NACIONAL DO MOVIMENTO BISSEXUAL BRASILEIRO em 2025!


Brasília/DF, 23 setembro de 2023